segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Resenha: “Minha Vida (Não Tão) Perfeita” (Sophie Kinsella)


Resenha publicada originalmente no Chalé Cult


Tradução de Carolina Caires Coelho

Por Kleris: “Um bom livro não é aquele que, quando encerramos a leitura, permanece um pouco apoiado no colo e nos deixa absortos e distantes, pensando que não poderia terminar?” – Mário Sérgio Cortella me representa aqui. Que mixed feelings! Tão acostumada ao estilo da Sophie, estou um pouco sem saber escrever como me sinto em relação a este livro. Mas tentarei.

Cat está imersa numa rotina bem louca enquanto caminha atrás de seu sonho – trabalhar com branding (conceito de marcas/design). Assistente em uma agência, ela está esperando e trabalhando pela sua grande oportunidade. Sua chefe, Demeter, é um furacão que deixa um rastro de inveja a qualquer um – e tem, aparentemente, uma vida perfeita, badalada, glamorosa. Cat também “sustenta” uma vida baseada no status, só que um bem distante do seu. Comete até loucuras (como entrar em cafeterias e tirar foto de cafés gourmet) pra mostrar a todos que ela está bem, está feliz e satisfeita.

Quando Cat é demitida, por conta de problemas na empresa, ela se joga em um novo empreendimento de seu pai, o que se torna uma grande aventura. Mas Cat ainda não resolveu o que quer ou como seguir em frente. Nesse ínterim, ela sugada de volta aos problemas e à empresa quando Demeter torna-se sua cliente e Alex, seu chefe crush, está ali para terminar um trabalho.

Minha vida (não tão) perfeita tem uma pegada diferente dos demais livros da Sophie. É bem mais suave, lúcida até. Apesar do que diz a capa (“Chorei de rir”, Jojo Moyes), eu não consegui rir como antes, em outros livros da autora, pois este não é bem uma tragicomédia. Não há casos extraordinários, improváveis, tresloucados ou surreais. Sophie traz a realidade. Algo mais próximo de um drama de costumes, mas sem perder, claro, o seu jeito Kinsella de ser.

Outro ponto diferente foi o gênero de público. Sophie é conhecida por tratar de mulheres adultas fortes e/ou independentes, e neste livro, ela ousou em se colocar na pele de uma millenium (geração Y). Vemos muito de uma garota em seus 26 anos que tá começando de baixo e está em desespero sempre – porque nossa geração é aquela acelerada, que se joga e vai em busca dos seus sonhos, não importa de que maneira, e que também se ferra muito por isso. Mas nem tudo é exasperação. Um ponto forte do team Y é justo transformar o limão numa boa limonada – ou melhor dizendo, transformar qualquer coisa em oportunidade (de mercado, se possível). 
Mas veja bem: não sou invejosa. Não exatamente. Não quero ser a Demeter. Não quero as coisas dela. Sei lá, tenho só 26 anos. O que eu faria com um SUV da Volvo?
Mas, quando olho pra ela, sinto uma comichão de... alguma coisa, e penso: será que poderia ser comigo? Teria como ser comigo? Quando tiver condições, eu poderia ter a vida da Demeter? Não são só as coisas materiais, falo da confiança também. Do estilo. Da sofisticação. Dos contatos dela.

Ao tratar desse desejo de crescer na vida, Sophie insere sensivelmente sua crítica sobre a rede de mentiras que se constrói na internet. Sobre como usamos as redes para nos sufocar e demonstrar uma vida que não é nossa. Como os filtros podem ser tão tóxicos e arrasadores quanto um ambiente de trabalho competitivo. Como essa competição pela foto ou vivência mais glamorosa nos faz perder o real momento. Como isso cria uma narrativa bem diferente para quem nos lê. E como essas mentiras todas podem interferir ou confundir a vida real. 
Depois de algumas semanas de funcionamento, percebi que alguns clientes só querem saber de perguntar: Vocês são sustentáveis? Porque isso é muito importante para nós.   
Sinto vontade de rir quando Demeter se esconde atrás de uma árvore. É inacreditável ver como uma pessoa inteligente pode se tornar uma tola que acredita em tudo o que ouve assim que ouve as palavras “orgânico”, “autêntico” e “Gwyneth Paltrow”. 
— Esse cavalo é especialmente místico. — Eu me aproximo de Carlo e passo uma mão pela anca dele. — Ele traz calma às pessoas. Calma e paz.
Mentira. Carlo é tão preguiçoso que a emoção que ele causa na maioria das pessoas é frustração. Mas não hesito e continuo:
— Carlo é o que chamamos de um Cavalo da Empatia. Nós classificamos nossos cavalos de acordo com seus predicados espirituais, como Energia, Empatia e Detox.
Quando digo isso, percebo que exagerei. Um cavalo de detox? Mas Demeter parece estar engolindo tudo. 

A escolha de tratar a história por um viés mercadológico e marketeiro foi um grande acerto, pois dessa maneira Sophie pôde nos demonstrar melhor do princípio que manipula as pessoas pelas suas fraquezas. Esse realismo coloca em xeque nossos desejos, sonhos e ilusões. É muito louco como a gente vive para reforçar, com palavras bonitas, sacadas de marketing, neurociência, um estilo de vida que não reverbera quem nós somos, mas quem queremos parecer que somos. E é tudo lorota! É como usar a sabedoria para semear o mal – para si e para todos. 
Talvez eu devesse entrar no Instagram agora. Postar alguma coisa divertida.Mas, quando rolo as imagens na tela do celular, parece que elas estão rindo de mim. A quem estou querendo enganar com essas coisas falsas e felizes? É sério: a quem estou querendo enganar?

Com certeza a gente fecha o livro pensando no que estamos postando em nossos perfis, quaisquer redes sociais que sejam. Toda a história, toda a abordagem, foram caminhos arriscados para se tomar, vide o grande histórico da autora, mas achei bacana que ela tentou sair dessa redoma. E me surpreendeu para onde ela levou a história. A alguns leitores pode parecer até morno em relação aos outros livros (e é em alguns pontos mesmo), por outro lado, prefiro encarar como uma história para exercer nossa empatia, senão nossa consciência. No mais, para ir sem grandes expectativas.


Minha vida (não tão) perfeita é um livro sobre as várias versões da gente. Sobre ser verdadeiros conosco, assumir nossa realidade. Sobre se arriscar em um projeto, mas não esquecer aquele sonho, nem de deixar de trabalhar por ele. Não poderia dizer que este é meu favorito da autora, mas relembro aqui uma frase de O sorriso das mulheres (aqui) que, como o trecho de Cortella no início do texto, vale como uma ótima conclusão: “Um bom livro é bom em todas as suas páginas”. 
Não posso deixar um contratempo destruir meu sonho, posso? Claro que não. Um dia vou trabalhar com branding. Ainda vou atravessar a Waterloo Bridge e pensar: Esta é a minha cidade. Eu vou chegar lá.

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comentários

  1. Ainda não conheço o trabalho da autora, mas fiquei fascinada com tudo que li acima! Nessa era do tudo virtual, é sempre bom levar um puxão de orelha para ver onde estamos jogando nossas vidas. Ou se de fato,estamos tendo vida.
    Muito perto da realidade e eu amo enredos assim, que nos trazem verdades e questionamentos bem plausíveis!
    Vai para a listinha de desejados!
    Beijo

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Ana Liberato