terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Resenha: "Cira e o velho" (Walter Tierno)

Por Sheila: Cira, ser mitológico de nosso país, aparece estampada em uma figurinha de jogo de "bafo". O narrador do livro, suposto dono deste grande e única preciosidade, embrenha-se no interior de uma pequena cidade onde vive Dona Nhá que, em sua linguagem truncada de negra velha conta a história de Cira e sua perseguição ao Velho, que fez nesta invencível e surpreendente mulher uma inimiga.

Mas para contar a história de Cira, Dona Nhá precisa ir mais longe e resgatar a lenda: de cobra Norato e Maria Caninana, o inusitado nascimento destas duas cobras meio humanas, filhos de um pai-cobra e uma mãe índia humana. A partir do desejo de Maria Caninana, quando já adulta, em poder virar gente, começa a história e o entrecruzar dos diferentes personagens, já que o desejo, que é atendido pelo Senhor das Mentiras, o fará mediante sacrifício de sangue inocente - incluindo uma das filhas de Norato, seu irmão cobra, e a bruxa Guaracy, que foi batizada por uma sereia.
- Que esta criança cresça forte e afiada. que domine o tempo e a vida, tornando-se um tributo de seus pais a estas terras, leitos de minhas águas. que seu nome seja Cira. (...)O cobra-pai viveu com Guaracy e Cira por mais dois anos, porém Norato não era criatura de se fixar e acabou retomando suas andanças. Porque Guaracy fosse a amante mais amada, tanto quanto Cira a filha preferida, apenas a elas o cobra-pai pagava visitas regulares.
Como a história passa-se no tempo do Brasil colônia, quando muitas matas ainda eram virgens e escravos eram trazidos de além-mar para trabalhar nas fazendas, o Velho, inimigo de Cira, é um sertanista que arrecadava aventureiros para embrenhar-se nas florestas atras de escravos fugidos, e que acaba cedendo à tentação do ouro e se tornando algoz dos filhos de cobra-Norato, selando assim seu destino.
O Velho nada mais disse. Apenas passou a lâmina no pescoço de Cira, que não soltou um som sequer, resignando-se a fechar os olhos e deixar sua vida esvair como seu sangue. (...) Guaracy e cira foram deixadas diante da casa em chamas. o Velho não sabia que bruxas como Guaracy são difíceis de matar. Mesmo que parem de respirar, um último suspiro é suficiente para lançarem um derradeiro feitiço, que é dos mais perigosos, pois o cérebro de um moribundo é confuso, ilógico e passional.
Devido aos seus sortilégios, mãe e filha escapam da morte, cabendo a esta última ir atrás da vingança contra o Velho, que nem desconfia que tal pudesse ser possível. Confesso que comecei a ler o livro com algumas ressalvas, não por envolver personagens folclóricos, mas porque é necessário que o autor saiba tornar a história interessante, o que Walter Tierno realiza com maestria.

A linguagem utilizada para explicar até mesmo as coisas mais banais, é revestida de uma sutileza e simplicidades que fazem do livro uma leitura divertida e inteligente, sem pontos soltos. e com descrições surpreendentes dos fatos. A própria morte é descrita numa linguagem que é pura poesia
A Morte, na verdade, não é uma ceifadora, vestida de preto, carregando uma enorme foice, com uma caveira no lugar do rosto. A Morte, na verdade, é uma menina de tranças vermelhas, vestida com uma toga azul-escura. é muito mimada.
Considero o choro da Morte por ver frustrada sua vinda, ao descobrir que as almas de Cira e Guaracy escaparam-lhe das mãos por obra de um feitiço um dos pontos altos do livro, bem como seu monólogo choroso tentando entender o pavor que "os de nossa raça" tem de si. Mesmo para quem não se interessa pelo gênero, é uma leitura que vale muito a pena, pelo resgate de nossa cultura ao mesclar fatos históricos com a lenda. Recomendadíssimo.

18 comentários

  1. já ouvi falar muito bem desse livro e sua resenha foi totalmente sincera quanto a nao gostar do gênero mas mesmo assim perceber quão valiosa é a obra. gostei, sheila :)

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  2. Pareceu interesantíssimo, gostei da resenha.
    Fiquei curiosa, pois essa iteratura não é mais tão recorrente como antes, usando de culturas folcóricas e lendas. Ótima dica!

    abraços,
    Luciana

    http://www.folhasdesonhos.blogspot.com

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  3. Adorei a resenha! Minha vontade de ler esse livro só aumentou, sempre li críticas ótimas a respeito do autor. Além disso, todo mundo fala que em termos culturais, esse livro é riquíssimo ^^
    Adoro essa capa, ainda mais por ter sido feita pelo próprio Walter, rsrs

    Abraços!
    http://leitorasanonimas.com

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  4. Uau!! Eu amei a resenha, e assim como adoro o gênero, confesso que fiquei morta de curiosidade pra ler logo. Maldade, viu? Haha

    xx carol

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  5. Ta ai um livro que eu não dava nada e a resenha me surpreendeu!

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  6. Gostei bastante da resenha, parece bem rico em detalhes do nosso folclore com uma historia bem interessante.

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  7. Tirando Monteiro Lobato nunca li nada que envolvesse folclore brasileiro, ta ai uma boa dica, fiquei afim de conhecer melhor esse livro.

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  8. Gostei da resenha.
    Que fofa a descrição da ''Morte''. haha

    Bom, eu leria esse livro, mas ele não me chamou muita atenção. Não sou muito fã de Folclore...

    Beijo. =*

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  9. Vocês precisam fazer uma promoção com esse livro, fiquei empolgadíssima pra lê-lo

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  10. Este comentário foi removido pelo autor.

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  11. Nossa, a falta de educação além de ser direcionada a resenhista e ao blog, também se estendeu a quem comentou a resenha, eu hein.
    Retiro o que disse, não gosto de ler livros de autor que se acha. Se a resenha fosse negativa, paciencia, mas a Sheila foi só elogios, não entendi a TPM.

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  12. Gostei da resenha e das citações, parece um livro bem interessante.

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  13. Bem legal a resenha!
    Eu ia comentar aqui que acho interessante coisas relacionadas ao folclore brasileiro, mas ja vi que o autor pode vir aqui rebater meu comentario falando que não tem nada a ver, desculpe, mas é essa a impressão que eu tive vendo só o basico da obra! rs

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  14. Bom pessoas, em primeiro lugar, obrigada pelos comentários, é sempre bom ver que o que escrevemos faz sentido para alguém. Fiquei numa dúvida imensa entre comentar ou não a deselegância de alguns dos comentários do autor do livro, mas me abstive. afinal se eu tenho direito de comentar sobre algo que ele escreve, por que ele também não poderia? Liberdade de expressão. Mas no momento em que vi o comentário da Luciana dizendo que deixou de comentar pelo que leu no post do Walter ... bom, aí eu é que resolvi me manifestar, mesmo as custas de perder a elegância. Acredito que todos tem o direito de se expressar e, por favor, não sintam-se intimidados em falarem o que pensam - crítica é uma palavra neutra, nós é que a recobrimos de acepções. Reitero que a OBRA que li antes deste presente momento, é mto boa, realmente gostei. Já o autor da mesma ... bom, deixo a vcs avaliarem.

    Forte abraço!

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  15. Este comentário foi removido pelo autor.

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  16. Sheila, sua resposta foi perfeita! Não poderia dizer nada mais propício.

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  17. Este comentário foi removido pelo autor.

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  18. Galera, eu muito provavelmente me expressei mal no meu comentário. Nunca foi minha intenção rebater nada nem criticar. Eu só quis explicar que a obra nunca teve pretensões catalográficas. Minha única intenção foi realmente agradecer a resenha, que foi muito elogiosa e aos comentários. E quando disse que agradecia o tempo utilizado pelas pessoas e a atenção em fazê-los, não estava sendo irônico. Estava realmente agradecendo. Mas, como eu disse, expressei-me mal e volto atrás em tudo, por isso apaguei os comentários que fiz anteriormente. Peço desculpas pela má impressão. De forma alguma intencionei criticar ou refutar. Mais uma vez, obrigado pela resenha e pelos comentários.

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Ana Liberato